5 de dez. de 2007

Capa

Geraldo Alves Martins

RETALHOS (memórias)


Feira de Santana
Junho/2003


Publicação do autor

Impressão
Edson Machado

Ilustração da capa
Solange Targino


Todos os direitos desta obra estão reservados a
GERALDO ALVES MARTINS

Apresentação

Filho de lavrador, com instrução primária incompleta, fui foiceiro, machadeiro, tropeiro, vivo "cantando" um pouquinho aqui, outro pouquinho lá. Sou um autodidata que não tive tempo de autoditar-me. Digo essas coisas para quando eu der minhas cacetadas no idioma de Camões não seja censurado. Já disseram "Quem erra sem lei, sem lei será julgado".

Este relato de minha vida o faço de modo sucinto, porque tenho horror à prolixidade. Nesta migalha de poeira que vive a rodopiar pelo espaço, que muitos chamam-na de Mundo Terráqueo, não sei se vivo, sofro ou vegeto. Só uma coisa estou certo: É que, quando eu transpuser os umbrais da existência estarei me desligando do elenco de uma peça teatral fantástica onde não sei se fui mocinho ou um palhaço das perdidas ilusões como canta o seresteiro.

Sumário

(clique para ampliar a imagem)


As Cobras
Figuras Pitorescas
Coisas da Vida I
Coisas da Vida II
Cometa Halley
Ruína
No Telhado
Pinga no Meu que Eu Pingo no Teu
Você
A Música Ebânea
Salvador
Cleó
Os Partos
Piraúna
A Hermafrodita


As cobras

Quando eu era menino, aos 7 ou 8 anos, peguei uma pequena cobra de uns 20cm e levei para casa. Arranjei uma garrafa e comecei a introduzi-la pelo gargalo. A cobra tinha as dimensões mais ou menos igual à espessura da entrada do gargalo. Introduzi todo o seu corpo no espaço em que cabia apenas dita cuja. Quando se libertou, a cobra saiu com tanta velocidade que quase me atinge o rosto. Atirei garrafa e cobra pra um lado. Era casa de fazenda. O piso era de assoalho e fez uma zoada danada. Minha mãe ao pressentir coisa anormal, veio ver a estrepolia do filho. É escusado dizer que a brincadeira acabou em chinelada.

Não desisti de brincar com as cobras. Certa feita, peguei um jaracussu, furei os olhos e soltei. Perversidade de quem não pensa. De outra feita, imobilizei uma cobra venenosa de mais de um metro, sozinho no meio da mata. Prendi seu pescoço com um gancho e tirei o couro, que saiu pelo avesso.

Perigo mesmo foi quando eu tinha 18 anos. Tomava conta de uma pequena fazenda de cacau situada bem no alto da Serra Piabanha, mais conhecida como Serra do Jequitibá. Quando ouço Agpê cantar: Moro onde não mora ninguém, lembro-me desta fase de minha vida. Vivia sozinho, trabalhava sozinho e o que era pior, dormia sozinho.

Colhia cacau, quando um fruto caiu numa moita. De lá saiu, furiosa, uma cobra Surucucu Pico de Jaca. Vinha tão furiosa que mais de um metro do seu corpo estava suspensa do chão em posição de ataque. Eu, com muita disposição e pouco juízo, cortei um cacete de um metro e meio e parti pra cima da cobra e dei-lhe uma cacetada, mais outra e mais outra, matando aquela serpente, que no dizer dos entendidos, tinha arriscado a vida, pois naquela posição ela é rápida e ataca a garganta do indivíduo.

Anos mais tarde me casei com uma jovem de 19 anos, bonita, meiga e inocente oriunda do meio rural com aquela simplicidade característica de moça do interior. Eu já experiente com meus 33 anos acreditava que tinha a missão de educá-la.

Quando chegava do trabalho ela vinha alegre feliz me receber me abraçando com meiguice e carinho revisando meus bolsos como à espera de encontrar um presentinho ou uma surpresa qualquer. Eu me deliciava com aquele charme e carinho ao retornar depois de uma jornada de trabalho.

Um dia encontrei um amigo cortador de pedra que me deu um presente inusitado: uma cobra coral dentro de uma garrafinha branca. Uma coisa linda! Botei no bolso e fui para casa. Quando cheguei, encontrei a mulherzinha vindo alegre e feliz a “futucar” meus bolsos como de costume. Quando encontrou a cobra deu um grito e “atiçou” a garrafinha na parede. A arrolha se desprendeu e a cobra escapuliu pior do que uma serpente de maior porte, feroz e agressiva. Quanto mais a mulher gritava mais assanhada a cobra ficava. Foi um sufoco. Pior disso tudo foi que ela suspendeu a lua de mel e fiquei a ver navios.

Hoje trago pra casa passarinhos ou outro bichinho inocente. Cobra mesmo, nunca mais!

Obs: Gostaria de assistir ao filme: “No vale das serpentes”.

Figuras Pitorescas


No final da década de 40 existiam em Salvador, figuras pitorescas que enriqueciam o folclore baiano. Entre elas estava a mulher de roxo que assim se vestia e não sei porquê razão. Seus trajes eram como se fosse um hábito de freira e vivia sentada nas escadarias dos prédios da Rua Chile. Calma, sem ofender a ninguém parecia uma monja só olhava, só pensava e nada mais.

Outra figura inesquecível era Cuíca de Santo Amaro. Poeta de Cordel. Quando acontecia algo de extraordinário, ele versava os acontecimentos com ironia e onde tinha aglomeração de gente, ele gritava mercalizando seu livrinho e assim ganhava vida. Como o caso da mulher de Brotas, que lhe deu boa renda. O caso foi o seguinte: Uma mulher que morava em Brotas, com ciúme do marido, decepou a matutagem do pela cepa. Isso deu origem a muitas “fofocas” nas ruas de Salvador. Com essa estória, Cuíca de Santo Amaro “lavou a jega” ganhando muito dinheiro.

A respeito, vale salientar um fato curioso: Nessa época fui fazer um trabalho topográfico no loteamento Nossa Senhora de Fátima, em Camaçari, hoje um próspero bairro naquela cidade. Estando hospedado na pensão Bela Vista, tranquei-me no quarto para fazer a correção dos meus trabalhos, quando começaram a botar em dia “a fofoca da época”, e o caso da Mulher de Brotas, era o mais comentado. Quando estavam discutindo o objeto cortante daquela façanha, eu precisando de qualquer coisa para fazer a ponta do lápis com o qual trabalhava, abro a porta do quarto e peço uma gilete. Para as mulheres foi um grande susto pois não sabiam que eu estava ali. Foi um risada geral. Eu me mantive sério e insisti que queria alguma coisa para fazer a ponta do lápis. Dava a impressão de que eu queria me decepar.

Outra figura bastante curiosa em Salvador era o “Jacaré”, um orador popular que não perdia um acontecimento. Ele ia para a praça pública para fazer discursos sempre inflamáveis. Era alto, moreno claro, bem afeiçoado, compleição atlética não robusta, trajava-se bem. Era quase um galã. Quando queria fazer seus discursos, mas vou me referir a dois deles: Certa feita cheguei ao Comércio, como é conhecida a Cidade Baixa de Salvador, principalmente, mediações do Elevador Lacerda e encontro Jacaré em cima de um tamborete discursando para a pequena multidão. Ele falava de Antônio Maria, radialista natural de Pernambuco que se candidatara a vereador na Bahia. O discurso de Jacaré era nesses termos: “Um pernambucano vagabundo vem de lá de sua terra querendo ser vereador na Bahia. Baiano descarado é quem vota num candidato deste”, e assim por diante. Dias depois, eu soube que pegaram jacaré e deram-lhe uma surra danada. Provavelmente algum correligionário mais exaltado do pernambucano. Quanto a Antônio Maria, não se elegeu e foi embora pra o Rio ou São Paulo continuando sua brilhante carreira, principalmente nos meios radiofônicos.

A segunda vez foi na posse do sucessor de Otávio Mangabeira, quando a Praça Municipal estava repleta de gente. De repente vejo Jacaré no meio da multidão com uma cadeira na mão que tomou na Pastelaria Triunfo e se alojou no meio da massa e começou a gritar: “Governador, venha se despedir do seu povo!”, parava um pouco e repetia sucessivas vezes, até que Mangabeira surge na saca do Aclamação e se despede da multidão que lhe aclamava e aplaudia. Do seu discurso de despedida gravei a seguinte frase: “As obras que fiz pela Bahia não foram por demagogia porque não sou candidato a nada”. Assim se despedia dos baianos aquele que foi um dos maiores governadores da Bahia. Fazendo lembrar do filme “Homens de Honra”.

Imagem: http://setarosblog.blogspot.com/2007/06/o-guarany-de-cludio-marques.html; http://www.novomilenio.inf.br/santos/h0312.htm

Coisas da Vida I


Eu, filho de lavrador, ao 17 anos, tropeiro e feirante e aos 20, barbeiro. Nessa época foi assistir uma luta de boxe no bairro em que morava. A primeira luta era de um caboclo forte bem malhado e contra um negro alto e magro, este apanhou tanto que foi nocauteado logo. O vencedor ficou no tablado pulando e desafiando: “Tem outro?” Não agüentei o desaforo e me ofereci para a luta. Calcei as luvas e parti pra cima do desafiante sendo que aquela era a primeira vez que assistia uma luta de boxe, sem treino, sem nada. Apanhei tanto que antes de ser nocauteado a turma do deixa disso entrou no ringue e me livrou de uma grande surra.

Imagem: http://www.boxergs.com.br/ditao3.jpg

Coisas da Vida II

Na vida a gente sempre se encontra em situações embaraçosas, como foi o meu caso quando estava hospedado em Rio Novo querendo fazer a praça de uma localidade vizinha há uns trinta minutos de trem. Chegando lá me hospedei numa pensão. Fui apresentado por um amigo e a dona do pequeno hotel por confiança me botou no quarto do coletor que estava viajando. Tinha uma pequena estante cheia de livros. Quis aproveitar para ler alguns. Como a lâmpada de 500 velas estava muito forte, tirei minha única camisa enrolando-a na lâmpada para diminuir a luminosidade, e foi ler tranquilamente. Quando percebi, a camisa estava pegando fogo, olhei e via as labaredas de elevando. Apaguei o fogo e tremi pelo risco de ter provocado um grande incêndio. Sempre tive sorte, a camisa queimou apenas a parte das costas, a frente estava intacta, dava para tapear e botar a gravata. O pior é que nada ganhei nessa praça e ao pagar a hospedagem gastei todo o dinheiro que tinha. Parti para a estação e tomei o trem de volta sem um tostão para pagar a passagem. Quando estava pensando no que iria fazer, chega a dona da pensão na janela do vagão e me pede para comprar um pão no Rio Novo e mandar pelo chefe do trem. Fiquei capitalizado, paguei a passagem. Em Rio Novo comprei o pão da mulher e agradeci a Deus que sempre me socorreu nas horas difíceis.


Obs: Igual ao filme “Uma Jogada do Destino”.

Imagem: http://www.globalframe.com.br

Cometa Halley

1910 – 1986, seu aparecimento no século XIX

Se vens singrando o espaço sideral
Com sua cauda luzente se arrastando
Do ponto do nadir ao Zenital
Que faça seu roteiro e vá passando.

Se tens fulgor de estrela e brilho astral
Com seu floco de luz se esvoaçando
Decline a trajetória orbital
E fique aqui na Terra circulando

Mas, se és tu que provoca terremotos
Os cismos, tempestades e maremotos
E provoca na Terra vendavais

Derrape na tangente do infinito
Mergulhe na poeira do atrito
Desapareça e não retorne mais.


Imagem: http://www.constelacoes.hpg.ig.com.br/numero_e_visibilidade_cometas.htm

Ruína

Esta casa que vês abandonada
Triste ruína a beira do caminho
Foi no passado alegre e habitada
Porque lhe decorava com carinho.

Hoje se vês sem teto e esburacada
Por toda parte o lixo em desalinho
Sem janela e a porta escancarada
Ao canto um jarro que ficou sozinho.

Assim como esta casa é nossa vida
Depois de muita luta muita lida
Paramos ao canto a envelhecer.

É como o sol que nasce à madrugada
Muito esplendor de luz pela alvorada
Pouco fulgor de brilho ao anoitecer.

No Telhado

Uma gato pegou a presa
Uma gatinha marisca
Depois de muita zoada
Ficou alegre e arisca.

Aí então perguntei
Quanto tempo se gasta
Depois de tanta aventura
Para pegar outra gata.

Gatão que disto se farta
E nem tão pouco se furta
Agarra logo outra gata
Porque a vida é bem curta.



Imagem: http://timon.blogs.sapo.pt/5259.html?replyto=127627

Pinga no Meu que Eu Pingo no Teu

Certa feita estava fazendo um serviço de topografia dentre da mata e como não tinha casa por perto, pois era uma área deserta, fizemos um fogo, ou melhor , diversos, pois tínhamos que dormir em rede a céu aberto. O fogo tinha outras vantagens: proteção contra o frio e a onça, além de iluminar a mata. A companhava-me nesse serviço um filho de 15 anos e uma turma de trabalhadores e foiceiros que abriam a picada. Durante a tardinha meu filho já me pregava um susto com a espingarda que tomou emprestada para caçada. Como não acertava um tiro se quer, ele encheu a dita cuja até o meio do cano e quando viu o primeiro passarinho, tacou fogo. Não outra coisa: a espingarda estourou no meio e foi chumbo pra todo lado. Quando vejo, lá vem ele gritando com o rosto ensangüentado. Foram ferimentos leves e como não tinha medicamento o jeito era lavar a cara e ir dormir.

Na hora do “rango” eu já estava em minha rede e os trabalhadores asando carne e outros comendo. Em volta de nós a escuridão da mata deserta, quando de repente ouvimos passos de um animal que abria passagem por dentro do matagal fazendo uma zoada terrível, quebrando paus que dava para escutar os estalos. Escutei aquela coisa e percebi os homens calados em silêncio absoluto.

Ouvia-se apenas o ruído do bicho e nada mais. Rompi o silêncio e perguntei: - Vocês ouviram? ... Eles começaram a gritar insultando a fera a pretexto de afugentá-la. Tivemos sorte porque ela desviou seu destino e minutos depois não se ouvia mais nada a não ser o silvo das cascavéis e o sibilar do vento.

Aí me vem a lembrança do que me contaram quando eu era criança. Certa feita um viajor depois de longa caminhada, procurou repouso no meio da mata. Fez um fogo, armou a rede e foi assar um pedaço de carne, quando surgiu de dentro de mato um negro magro, alto e de olhos vermelhos e esbugalhados. Mal deu boa noite e foi se acocorando junto ao fogo e sacou de dentre de uma mochila suja, um espeto com um bocado de lagartixa, sapo, aranha e outros insetos e começou a assar aquela coisa horrível. O viajante estava estarrecido sem fôlego para dizer uma só palavra. O negrão de vez em quando passava sua matutagem por cima do seu churrasco dizendo: “Pinga no meu que eu pingo no teu”. O viajante deu uma olhadela para conhecer seu companheiro de jantar, quando percebeu que ele tinha os pés de casco de cavalo. Não teve dúvida: estava diante do diabo em pessoa. Quando lhe veio uma idéia dessas que desce do além, como disse o poeta. Passou então sua carne por cima do assado macabro do demônio em forma de cruz. Foi a salvação. Ouviu-se um urro muito grande e cheiro de enxofre e se atirou pela mata adentro como se fosse um touro enfurecido. Deixou um rastro na mata que dava para passar um carro de boi. Quem passa por aquelas bandas ainda ouve em noite de lua cheia uns uivos de uma raposa vindo da direção que o bicho fugiu.

Esta veio por um pé de pinto e saiu por um pé de pato e o Rei, meu Senhor, mandou dizer que me contasse quatro.

Imagem: www.baixaki.ig.com.br


Você


Você disse que vinha e lhe esperei
Despertei com o clarão da
Lua e o cintilar das estrelas
Julguei ser você. Não era.

Assustei-me com o farfalhar das
Palmeiras ao soprar do vento.
Pensei ser você. Não era.

Acordei com o clarão do sol
Ao romper da madrugada.
Imaginei ser você. Não era.

Tive tudo nessa noite – O carinho
Das estrelas, o frescor da madrugada
E o calor do sol ao romper da aurora.
Só não tive você.

Imagem: http://otdaquestao.blogspot.com/2007_10_01_archive.html

A Musa Ebânea

Encontrei-a em plena rua onde passava. Não tinha aquele fulgor ardente de uma fornalha de desintegração atômica. Não era bonita como a Vênus de Milo ou a rainha do Egito. Não primava pela beleza. Seu encanto primordial eram os movimentos anatômicos de suas formas. Aquele gingo envenenado que fazia quando andava era para fazer qualquer um ficar louco e fiquei. Andei atrás até vê-la desaparecer no meio da multidão.

A noite ao me recolher lembrei-me daquela visão provocante. Era como se me sentisse impulsionado pelas forças do arco de um cupido alucinado. Amei-a sozinho. Não medi esforços para satisfazer meus impulsos românticos atendendo aos implacáveis desejos da carne. Depois de tudo consumado lembrei-me de um soneto de Augusto dos Anjos:


Lamento das Coisas

Triste a escutar pancadas por pancadas
E as sensibilidades dos segundos
O som subterrâneo do Orbe oriundo
E o choro da energia abandonada

É a dor da força desproveitada
Dos contochões dos dínamos profundos
Que podendo ver milhões de mundos
Jaz agora na estática do nada

É o soluço da forma inda imprecisa
Da transcendência que não se realiza
Da luz que não chegou a ser lampejo

É, em suma, o subconsciente aí formidando
Da natureza que parou chorando
No rudmentarismo do desejo.

Imagem: http://marciojames.wordpress.com/category/design/page/2/

Salvador

Em plena Segunda Guerra Mundial, ano de 1944, estando em Itabuna sem emprego, pego um navio cargueiro com destino a Salvador. Viagem horrível margeando o litoral para se livrar de submarinos. Esse navio balançava como se fosse uma pequena embarcação sobre ondas. Saltamos em Salvador. Quem salta no Cais do Porto e desce de um navio cargueiro como seu, sente a falta de melhor asseio, melhor preparo para receber os visitantes. Para mim que saltei com a bagagem envolta em papel de cimento estava bom até demais. Fui em direção ao Elevador Lacerda onde procurei por uma hospedaria, encontrando a uns cem metros dali. Em um casarão antigo aluguei uma cama, paguei adiantado e foi dormir, quando olhei para o colchão, estava com uma camada de pus. Coisa horrível. Pensei não ser problema e virei o lado. Estava pior. Descia as escadas e comprei um jornal forrei o chão e dormi tranquilamente. A minha surpresa só foi maior porque os jovens daquela época eram atacados de uma doença venérea – blenorragia – cuja característica era expelir pus pela uretra. Portanto ali havia estado um colega portador da “dita cuja”. Um dos motivos de minha a a Salvador era, além do emprego, procurar os postos de saúde para o tratamento, pois em Itabuna na época não havia. Logo, logo, tivemos que abandonar aquela espelunca pois o gerente quando percebeu que a gente estava comprando pão e bolacha para fazermos a refeição ali no quarto, nos proibiu de fazê-lo que só tínhamos o direito de dormir e depois “cair fora”. Fiquei alucinado. Sem dinheiro e sem apresentação foi difícil encontra um quarto para alugar. Encontramos um na Ladeira da Montanha. Como não tinha cama e nem colchão, fomos à feira de Água de Meninos e compramos duas esteiras, uma para mim e outra para o colega. Agora estávamos alojados. Salvador muito quente não precisava de cobertor. O que mais incomodava era o “quipá”, ou melhor, sarna, além da blenorragia, era o que mais incomodava, era também uma espécie de epidemia da época que atacava as pessoas de menor recursos, como no meu caso. Às vezes, não podendo dormir, eu pegava os testículos, ou melhor, o couro que os envolve, e esfregava como as lavadeiras fazem para lavar roupa: pegam o pano com as mãos e esfregam. Assim fazia eu. Quando estava nessa agonia para aliviar minha coceira ouvi uma velhinha a gritar de um quarto vizinho: “Quero mijar!”. Penalizado, eu pegava a velhinha e levava para mijar. Acontece que a velha também tinha o quipá. Não dormia a noite se coçando. Uma andar acima morava a senhora filha dessa pobre velha no maior conforto possível. Era mulher de oficial da Guarda Nacional. O casal tinha uma filha garota morena, tinha mais ou menos uns 14 anos, meiga, mimosa, bem tratada, mas eu lhe garanto que nunca visitou sua avó. Abandonada no andar inferior do prédio a gritar: “Eu quero mijar”.

Ao fim do mês pagamos a conta direitinho e fizemos uma viagem. Quando chegamos faltavam três dias para o vencimento do segundo mês. A mulher após o recebimento do dinheiro disse: “Agora eu quero o meu quarto”. Mas a dona foi categórica: “Quero o meu quarto”. Entregamos e fomos atrás de uma pensão. Ninguém nos aceitava. Com aquela bagagem embrulhada em saco de cimento eu dava até razão. Felizmente encontramos José Silva na rua do Gasômetro, 26, Calçada, que nos hospedou por quase dois anos.

Passando uns três ou quatro meses, foi visitar a velhinha da Ladeira da Montanha. Depois dos cumprimentos de praxe, perguntei por sua mãe: “A velhinha faleceu”. Respondeu com alegria estampada na face. Foi me mostrar o quarto onde ela vivia ou sofria. Aquilo que era uma desordem cheirando a mofo, agora tinha até cortina, tudo limpinho para conseguir um bom aluguel.

Quase 60 anos depois passando pelo local, parecia ouvir o clamor da pobre velhinha: “Eu quero mijar!”.


Obs: Me faz lembrar do filme “Do Mundo Nada se Leva”.

Imagens: http://mgallo.zip.net/arch2006-12-01_2006-12-15.html; http://www.cidteixeira.com.br/Template.asp?IdEntidade=293&Nivel=0002000200060001


Cleó

Após o término da Segunda Guerra Mundial, estando morando em Salvador, rua do Gasômetro, 26, dei uma estirada a Santo Antônio de Jesus com a finalidade de melhorar a condição de vida pois vivia de vendas a domicílio.

Procurei uma pensão modesta, mas a que eu me hospedei era pequena e modesta até demais. Basta dizer que tinha de recuar a mesa de jantar e estender uma toalha no chão do barro mal batido para se fazer as refeições. Por aí se faz uma idéia.

Uma coisa gostei desse espelunca, era que ali também se hospedavam mulheres de vida livre e quando uma ou outra menstruava, a dona pedia para que dormisse na minha cama para que as colegas pudessem trabalhar na luta do pão de cada dia. Quanto a mim só restava agradecer à companhia agradável. Atolado por atolado eu já vivia.

Ou episódio que vale a pena lembrar é que eu estava muito doente com uma anemia profunda e não tinha condições de me tratar, quando lembrei-me de uma fórmula de alisar cabelos que aprendi em Itabuna, minha terra natal.

Preparei a pasta e chamei uma mocinha que passava na rua e dei uma massagem de graça com o propósito de trazer uma colega pelo preço de cinco mil-réis, a moeda da época.

Com esses trocados consegui me tratar e procurar um hospedaria melhorzinha. Lá conheci um hóspede vindo do nordeste para vender um fumo e, quando o fez, tomou umas e saiu pelas ruas a gritar: “Quarenta contos! Quarenta contos!”, isto em voz alta. Chegou na pensão e cantou a dona para a noitada. Ela não aceitou mas indicou a dona da pensão que eu tinha me hospedado. Era uma megera magra, cor escura, lá pra os seus 60 anos. Como a proposta era gorda a velha aceitou. No outro dia ouço o comentário: “Foi a noite inteira. Parava um pouco, bebia um preparado que levou na garrafa e continuava, e assim foi a noite toda deixando a velha de cama. Depois dessa façanha pagou a conta, arrumou a trouxa e se foi.

Quanto a mim voltei a Salvador e continuei minha vida até que surgiu a oportunidade de ingressar na vida pública como Auxiliar de Engenheiro, numa virada que o destino determina às vezes para melhor, o que foi o meu caso e dois anos depois viajo a Cícero Dantas como auxiliar de engenheiro para fazer uma divisão intermunicipal e, percorrendo a região, encontro o plantador e vendedor de fumo. Conheci pela voz. Perguntei ao filho do prefeito que me disse que ele era famoso na região pois preparava a “garrafada” com poderes afrodisíacos e que, as mulheres não queriam nada com ele, pois quando começava não queria mais para com aquela fúria incontida que não tinha quem agüentasse. Estava confirmado: era a fera dos “Quarenta Contos! Quarenta Contos!”, de Santo Antônio de Jesus.

Terminada essa missão, fui designado para fazer um estudo de barragem no rio Cariparé, tributário do rio Grande que por sua vez é afluente do rio São Francisco. Nesse estudo fizemos quatro ranchos na mata ou caatinga grossa. Gastamos 60 dias de estudo. A região era infestada de feras; como seja a onça, caititu e porco do mato, este era o terror dos mateiros. Andavam em varas, esfomeados, truculentos e ameaçadores. Quando encontravam um ser vivo, cão ou mesmo o homem, eles trituravam que ficavam apenas fragmentos de ossos.

Uma única vez à noite, fomos acordados pelo alerta dos trabalhadores para subirmos em árvores, onde passa todo o perigo. Mas felizmente foram embora nos deixando em paz.

Houve de tudo neste serviço, inclusive a parte romântica. Quando me queixei da falta de mulher, um dos trabalhadores me disse que a empregada foi mulher de vida livre. Tudo bem, só que a tal tinha pra lá de 70 anos com a face enrugada e castigada pela ação do tempo. Um dia chegando ao rancho ela me perguntou: “É verdade que Francisco me contou?”. Confirmei. Ela me disse: “Amanhã”. No outro dia cheguei na barraca, ela já me esperava com uma esteira velha no ombro e disse: “Vamos por ali”. E encontrou por uma picada até chegar a beira de um córrego perene que mais parecia um canal artificial. Suas águas cristalinas fluíam suavemente, borbulhavam na sinuosidade de suas curvas. A passarada aumentou o seu trinado e até a brisa no frescor do bucolismo daquela tarde aumentou sua suavidade como a festejar o acontecimento. Ela estendeu a esteira à margem do córrego e descerrou a cortina, o espetáculo apareceu: um corpo escultural digno de uma rainha. Lembrei-me até de Cleópatra quando saía de sua banheira láctea. O nome dela era Esteva, mas vou chamá-la de Cleó em homenagem ao país das pirâmides.

O segundo encontro com Cleó se deus alguns dias depois. Faltou carne e o engenheiro mandou matar um boi. Trabalhamos pela manhã e à tarde foi feriado da matança. Como tinha 12 peões, um engenheiro e um vaqueiro, eu peguei uma espingarda, botei uma bala de chumbo, pouco menor que um bola de gude e saí pra uma caçada na esperança de matar pelo menos um cititu ou talvez, quem sabe, uma anta de por de novilho. Naquelas matas, um turista matou um novilha do rebanho do coronel Cajazeira por engano.

Enquanto eu caminhava na mata ouvia os gritos da turma da vaquejada. Lá pra tardinha, como nada encontrei para descarregar minha espingarda entupida de chumbo, dirijo-me ao local da matança e encontro o engenheiro com seus 12 peões encima das árvores. No chão somente o vaqueiro montado num cavalo branco a esbravejar e blasfemar por ter perdido dois cachorros. Vaqueiro quando perde um cachorro é o mesmo que perder um filho. Perguntei: “Posso matar:” Com a confirmação, mirei num pequeno espaço entre a orelha e o chifre e disparei. Não deu outra, o boi titubeou e caiu. A turma desceu das árvores e foi tratar de esfolar, retalhar, etc.

Nesse momento me lembro de Cleó. Vi que eram muitos homens para pouco boi. Disparei em direção ao rancho onde encontrei-a nos afazeres domésticos. Agarrei-a pelos cabelos. Se fosse hoje cantaria: Pra não cair do seu galope. E na beleza desta hora o sol espera pra nascer.

Depois fui para o rancho descansar um pouco, jantar e dormir o sono dos justos, um sono tranqüilo pelo dever de uma missão cumprida.

Hoje, aos 82 anos, gostaria de me encontrar com o plantador de fumo para que me ensinasse a fórmula daquela “beberagem” para que a coisa fique assanhada, empinada e resistente como um bico de pica-pau amarelo para eu sair pelas estradas a fora cantando: “A vida é tão pequena para tanto amor!”. E depois assistir ao filme “Os Brutos Também Amam”.

Imagens: http://jogosdeluzesombra.blogspot.com/2007/07/clepatra.html; http://www.cofel.net/nossacidade/stoantonio.html

Os Partos

Dentre as coisas que eu fiz na vida que me deixou encabulado foi a de servir de parteiro. Embora não intervindo diretamente, mas contribuindo sensivelmente para que dois brasileiros viessem ao mundo. Isto aconteceu na cidade de Cansanção. Fui chamado, não sei porquê, pois sou topógrafo, para dar assistência a uma parturiente distante, mais ou menos 01 km da cidade. Lá chegando fiquem sem saber o que fazer pois nada entendia do assunto. Como no Nordeste não havia assistência médica e o nordestino vive em completa miséria, ali estava eu para o que desse ou viesse. Existia na cidade um farmacêutico que por força das circunstâncias se passava por médico. Fui até ele. Já acostumado com estas situações me disse: “Procure saber quantos dedos faltam para coroar. Quando estiver com dois dedos, fosse lá que ele daria um jeito”. Era engraçado. Me recostei a uma árvore em frente à casa e pergunta de vez em quando: “Quantos dedos? ...” Eu já estava ansioso por aqueles dois dedos desejados. Até que deram a notícia, aqueles dois dedos almejados estava no ponto e a mulher estava preparada para a etapa final. Procurei o farmacêutico que me deu uma injeção par que aplicasse na parturiente. Isso feito, dentro de cinco minutos, ouvimos o choro forte da criança que estava vindo ao mundo para a luta pela sobrevivência da vida e enfrentar todas as dificuldades do tempo naquela região nordestina.

Eu visitava sempre aquela família para saber como ia passado o meu amigo. Com mais ou menos três meses procurei saber, estava doente. Perguntei à mãe: “Já deu algum remédio:” “Dei chá de mosca”. A princípio fiquei calmo pois pensei de tratar-se de uma plantinha qualquer. Desconfiado perguntei: “Que mosca?” Ela me disse: “Dessas que passa aí voando”. Quase caí de costas. Não houve na farmácia de meu amigo uma remédio que melhorasse a saúde da criança e em três dias o óbito acontecia. A vida do nordestino estava encerrada mesmo antes de se preparar para a grande jornada, mesmo antes de a ter conhecido, se foi.

O segundo caso foi nos idos de 55, quando ainda residia naquela cidade, foi procurado por um rapaz com mais ou menos 20 anos cuja mulher estava com dores de parto. Procurei logo orientação ao farmacêutico e ele me disse: “Vá lá e quando tiver com o coramento de dois dedos, venha aqui que dou um jeito”. Quatro horas da manhã saímos de bicicleta, pois era o meu transporte da época. A casa do rapaz ficava a uns quatro quilômetros da cidade. Chegando à casa da parturiente, fui logo fazendo a clássica pergunta: “Quantos dedos tem de coroamento:” Pela resposta vi que ia demorar. Lá estavam muitas mulheres. De repente uma delas disse: “Por que não chamam a Preta Velha:...” Escolheram uma idosa que acendeu dois cachimbos: m para si e outra para a médium. Estava assim reunida uma sessão espírita em plena madrugada sertaneja. A entidade espiritual foi objetiva: “O parto está sem problema, é questão de tempo. Dê um mingau de cachorro para esquentar a parturiente e o menino. Quanto ao doutor que está aí, nada a fazer, porque ele nada conhece do assunto”. Quando o dia vinha clareando, chamaram-me no quarto. Ali encontrei a mulher na posição de dar luz. Era jovem e morena e, com as pernas escancaradas, eu vi que não havia tempo de medir nada. A criança já aflorava sem o menor sacrifício, uma velha agoniada dizia: “Olha aí doutor!” Eu, pai de três filhos, jamais tinha me achado num quadro daquele. Foi quando vendo minha imobilidade, aparou ou amparou a criança. Nessa hora, o sol com seus raios rubros invadiu a casa rústica do sertão como querendo saudar o pequeno nordestino, que se não tomou chá de mosca, está hoje a revolver o solo causticante do Nordeste pela sobrevivência da vida.

Saravah meu pai.


Obs: O filme que me vem à lembrança é “Vidas em Jogo”.

Imagens: foto 01 (http://www.ferias.tur.br/localidade/493/cansancao-ba.html); http://amigodemontaigne.blogspot.com/2007_02_01_archive.html




Piraúna

Piraúna, que olhando no mapa encontrei Piauma. Não sei se mudaram ou mudei eu, nos recônditos de minha memória. A passagem por esse lugar ficou na minha lembrança para o resto da vida por causa dos episódios que marcaram traços de importância na caminhada de minha existência. Cheguei àquele povoado vindo de canoa de Ubaitaba. Procurando me hospedar em pequena e única pensão existente naquela época. Isto é lá pros anos 40. Logo de primeira, a dona da pensão me levou na cozinha para me dar um copo com água e de imediato foi se insinuando naquela ânsia incontida de sexo, onde, eu também no fogo dos meus 20 anos, não medi esforços e ali mesmo apressadamente curtimos nossos desejos incomensuráveis. Esta mulher trajava-se de cigana. Vestido comprido quase todo feito de retalhos vermelhos, cabelos compridos presos com um pente grande, era morena, esguia, tipo cigana. O marido parecia que não se importava, pois nas ocasiões que eu ia à cozinha curtir a cigana, deixava-o na sala conversando com as pessoas. O meu reencontro com a cigana se deus meses mais tarde quando lá voltei e encontrei outra pensão e à noite ao entrar no meu quarto encontrei a cigana a me esperar, amável, sorridente e sensual. Deixando-me contrariado, pois já havia combinado com a dona da pensão para vier me fazer companhia durante a noite. Com a presença da cigana o trato foi desfeito. O jeito foi me contentar com a cigana mesmo. Mulher terrível, depois do primeiro e segundo exercício, ela insistiu por mais! Aí não agüentei e desisti. Ela saiu dizendo que iria atrás de homem porque não estava encontrando. Saiu alucinada. Sou mais tarde, meses depois, que um negociante, seu amante, havia lhe dado uma surra por traição – a mulher traía demais.

Meses depois chego à cidade e não encontro pensão e nem cigana e nem nada. Pedi ao chefe do Instituto de Cacau da Bahia daquele lugar para dormir num armazém aberto que lá existia, cheio de cacau ensacado. Quando me preparava para dormir escuto discussão numa casa do fundo do armazém. Era um casal brigando e imediatamente escuto pancadas e gemidos. Tive impressão que havia morte naquele episódio. Não dei importância ao fato e fui dormir, viajando no outro dia cedo. De volta uns cinco dias depois, estando dormindo no mesmo local, ouvi vozes de mulheres na porta do armazém. Pensando na cigana fui ver e encontrei uma mulher forte de cor escura. Convidei-a para me fazer companhia, aceitou e pronto. Depois dos inevitáveis exercícios fomos conversar, quando contei o que havia ouvido na última noite que tinha dormido ali, ela disse: “Foi comigo, eu moro nesta casinha aí. Foi meu marido, deixe uma surra de facão e quase mato”. Aí eu disse comigo mesmo: “Estou mal acompanhado”. Mesmo assim fomos dormir ali mesmo em cima dos sacos. Quando me levanto lá pela madrugada, procuro a mulher, nada, procuro minha calça e nada, procuro o dinheiro, minhas férias, produto daquela excursão e não encontrei. Aí tremi de medo. A calça era única. Como sairia daquela situação num lugar desconhecido sem dinheiro e nu? Situação terrível que não desejo a ninguém. Saí por entre as filas de sacos pela madrugada a procura da mulher. Vejo um fogo um pouco distante. Fui para lá. Que felicidade. Encontrei a mulher se esquentando no fogo que ela mesma fez. Quando me acocorei junto a ela, percebi logo minha caça enrolada no seu pescoço. Quando pedi, ela teve até um susto pois pensava que era uma toalha. Verifiquei o bolso e o dinheiro estava lá. Sem faltar um tostão, ela apanhou a calça por engano.

Hoje, quase sessenta e cinco anos depois, ainda me recordo da viagem de volta daquele povoado, viagem feita de canoa onde o murmúrio das águas eixa fascinado qualquer visitante que se arriscava visitar Piraúna. Quando olhei aquele povoado cheio de mistério e aventura e ao ver as luzes perdendo o seu brilho, pois os raios solares chegava invadindo tudo, lembrei-me do título de um filme que não assisti: “Foi a última vez que vi Paris”.


Imagem: www.guardioesdaluz.com.br/ciganoshistoria.htm



A Hermafrodita

Forte...aperte... o dedo mais profundo... não se enganem não estou apertando um parafuso e nem forçando uma peça de ferro, estou com o dedo dentro da vagina de uma mulher. Vou contar como isto aconteceu. Foi em 1950, ano em que o Brasil perdeu para o Uruguai a disputa da Copa do Mundo. Saí para dar uma voltinha pela rua São Miguel, Salvador, Bahia, quando uma mulher me chama e pede um cigarro, pretexto muito usado para começo de uma conversinha. Foi ao seu quarto iniciando carícias habituais a título de esquentar as turbinas. Ela me confessou que tinha costume de inalar éter acredito que era uma cantada para que eu aderisse àquele hábito. Como não dei importância, ela parou e continuamos as amabilidades. Ela propôs que introduzisse o dedo em sua vagina pedindo que eu apertasse e fizesse fricção num órgão localizado no lugar clitóris com a dimensão, mais ou menos, de um dedo polegar.

Aquela coisa enrijecida me deixou assombrado. Meu medo era de que aquilo se desprendesse de onde estava alojado. Fazia muito calor dei pra suar, olhei para a porta, estava fechada, meu nervosismo aumentou. Naquela situação somente meu vexame se elevava e mais nada. Estava louco para fugir daquela situação. Ela olhou para mim e como seu não apresentava nenhuma reação, reclamou dizendo: “Você não está gostando, vamos parar”. Felizmente com a desistência fiquei livre daquele sufoco.

Passado alguns mesmo compro o jornal A Tarde, que naquele tempo circula à tarde mesmo, e leio a seguinte manchete: “Mulher se joga do Elevador Lacerda”. Quando vejo a fotografia, era ela. Pois na hora das carícias ela me mostrou aquela mesma foto. Uma fantasia de carnaval, vestida de homem característico de vaqueiro e mais a notícia de que ela inalava éter. Era o fim daquela mulher que acredito tenha sido um caso característico de hermafroditismo.


P.S: Este relato me faz lembrar dos filmes: “Faces da Aberração”, “Que mulher é Essa”, “Um Estranho na Torre” e “Pague para Entrar e Reze para Sair”.

Imagem: http://www.espacoacademico.com.br/042/42cherold.htm

Geraldo, Rosa, Andre e Maria

Sr. Geraldo, Rosa (amiga da família) com o filho André e D. Maria, esposa de Geraldo. Foto feita agosto de 1994.

Sobre o blog

Este blog é uma coletânea de pensamentos de Geraldo Alves. Os marcadores separam os assuntos por interesse. Para ler os livros, clique no marcador correspondente.
1. Livro Retalhos.
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