5 de dez. de 2007

A Musa Ebânea

Encontrei-a em plena rua onde passava. Não tinha aquele fulgor ardente de uma fornalha de desintegração atômica. Não era bonita como a Vênus de Milo ou a rainha do Egito. Não primava pela beleza. Seu encanto primordial eram os movimentos anatômicos de suas formas. Aquele gingo envenenado que fazia quando andava era para fazer qualquer um ficar louco e fiquei. Andei atrás até vê-la desaparecer no meio da multidão.

A noite ao me recolher lembrei-me daquela visão provocante. Era como se me sentisse impulsionado pelas forças do arco de um cupido alucinado. Amei-a sozinho. Não medi esforços para satisfazer meus impulsos românticos atendendo aos implacáveis desejos da carne. Depois de tudo consumado lembrei-me de um soneto de Augusto dos Anjos:


Lamento das Coisas

Triste a escutar pancadas por pancadas
E as sensibilidades dos segundos
O som subterrâneo do Orbe oriundo
E o choro da energia abandonada

É a dor da força desproveitada
Dos contochões dos dínamos profundos
Que podendo ver milhões de mundos
Jaz agora na estática do nada

É o soluço da forma inda imprecisa
Da transcendência que não se realiza
Da luz que não chegou a ser lampejo

É, em suma, o subconsciente aí formidando
Da natureza que parou chorando
No rudmentarismo do desejo.

Imagem: http://marciojames.wordpress.com/category/design/page/2/

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